O mundo de hoje é ainda um mundo de homens. Vivemos ao abrigo de uma ordem social masculina e até contra feminina, segundo muitos autores. Sim, cada vez menos mas, sim, ainda vivemos. Desta forma muitos estudiosos da problemática, consideram que a emancipação feminina só acontecerá quando as mulheres afirmarem a sua própria cultura na oposição desenfreada à cultura oposta, ou seja, a masculina. Outros, provavelmente mais adeptos do consenso, consideram que bastará a afirmação da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Segundo Simone de Beauvoir a biologia humana trouxe vantagens aos homens enquanto sujeitos soberanos e a assimetria dos papéis tradicionais, referentes aos dois sexos, pode explicar a discriminação das mulheres enquanto categoria social. Esta ordem androcêntrica, e dominante, é tão ancestral que segundo vários autores tem os seus ícones mais significativos em “Safo” e “Aspásia”. Estas figuras femininas foram tão importantes para o seu tempo, na medida exata em que também foram ostracizadas: Safo ficou conhecida e “etiquetada” como lésbica e a 10ª musa, quando na verdade foi uma magnânima poetisa, percorrendo um estilo de vida emancipador e independente, escapando ao jugo de qualquer figura masculina, ao contrário do que era próprio da altura. Quanto a Aspásia, a sua pessoa reduz-se frequentemente ao papel de amante perversa de Péricles, escamoteando-se a mulher intelectual e filósofa de Atenas com grande ascensão sobre a ação e o pensamento.
Ou seja, quando delas não se pode ignorar há que as estigmatizar para as desvalorizar, mantendo o “satus-quo”. Mas esta diferenciação – feita descriminação – percorreu toda a antiga Grécia e fundou-se neste arquétipo que vem marcando a humanidade ocidental, porque daquela se edificou esta. As mulheres vão sendo entendidas e agidas como o outro sexo: o segundo sexo. A espécie humana menos significante.
Se tal é verdade, não menos verdade é que esta subalternização foi sendo acompanhada de lutas e relações de forças que foram assumindo maior ou menor impetuosidade consoante o período histórico que se foi experienciando. E não nos estamos a referir exclusivamente aos anos 60 e 70 com os movimentos feministas, pois de lutas mais ou menos silenciosas em todas as épocas se foi traçando a condição da mulher. O busílis da questão está no facto de que ao fundar-se um arquétipo de pensamento muito ancestral, tão anterior que vai às fundações da humanidade, este irá marcar toda a “história futura”. Assim, esta distinção foi-se arrastando e prolonga-se até hoje, tendo o género masculino assumindo-se como medida de todas as coisas.
(Continua amanhã)
Marcos Taipa, autor em Sociedade Justa, grupo privado sociedade justa
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