Suponho que o leitor já terá quebrado a cabeça a saber como aplicar o manual de instruções para que algo funcionasse. Nesta minha suposição, e porque eles já nascem com o manual de instruções integrado, vejo os seus pequenitos, aí ao lado, reguilas e atentos, a rirem-se como perdidinhos, apreciando o seu mau-jeito no desbravar de tal tarefa. Mas, tenha calma, não coloque a paciência a pique, não se dê por vencido, desunhe-se, eles baterão palmas!
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O manual de instruções é a ferramenta que informa sobre um conjunto de procedimentos a ter em conta, pois, quem inova, quem cria coisas, quer que elas funcionem bem e que, quem as usa, delas saiba e possa tirar proveito.
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Ora, nós somos obra de Deus, criação de Deus. Não máquinas, mas pessoas. Pessoas livres, que pensam, amam, inventam, criam e fazem coisas, boas e menos boas. Somos um pequeno grande mundo com alma. Um complicado microcosmos no qual toda a criação encontra sentido. Então, se somos assim obra tão importante, se estamos no centro de toda a criação, será que, como andarilhos por este mundo fora, andamos por aí a funcionar mal, engalfinhando-nos e matando-nos uns aos outros só porque Deus se esqueceu de nos fazer acompanhar de um manual de instruções?
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Pelo que vamos sabendo e experimentando, as dificuldades que o homem sente da parte da inteligência, dos sentidos, da imaginação, dos desejos e da vontade transcendem-nos. As aventuras de Adão e Eva, que mandaram às malvas o manual de instruções que lhes foi dado para que funcionassem bem, estão na origem do problema a que chamamos pecado original. Mas, a anos-luz de distância, que temos nós a ver com isso, se ainda por cima o pecado é de responsabilidade pessoal?
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Pois, só que a expressão ‘pecado original’ não se refere ao pecado pessoal que nós cometemos. É um pecado contraído, não cometido. É um estado, não um ato. Adão e Eva tinham recebido a santidade e a justiça originais, não só para si, mas para toda a natureza humana. Ao recusarem seguir as instruções e consentirem na tentação, eles afetaram a natureza humana que agora transmitem num estado decaído, privados da santidade e da justiça originais.
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Em virtude desta unidade do género humano, todos estamos implicados nesse pecado, do mesmo modo que estamos implicados na justificação de Cristo. Trata-se, pois, deste estado nocivo da humanidade em que nasce o indivíduo, antes mesmo de pecar por mau uso da sua liberdade, inteligência e vontade.
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É a história do princípio da humanidade, é a história de todos os tempos. Todo o género humano é, em Adão, como um só corpo dum único homem, diz-nos a Igreja. É certo que a natureza humana não se encontra totalmente corrompida, mas está ferida nas suas próprias forças naturais, sujeita ao sofrimento, à ignorância, ao sofrimento, ao pecado, à morte.
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O Batismo, ao conferir a vida da graça de Cristo, apaga o pecado original e reorienta o homem para Deus, mas persistem no homem as consequências, a natureza enfraquecida e inclinada para o mal a implicar combate espiritual (cf. CIgC 404-405). E a graça de Deus não se impõe, não agride a liberdade humana. É um dom que ajuda a agir bem, mas só o faz em quem se abre à sua intervenção. Natureza e graça não se opõem, irmanam-se, ajudam-se.
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O cardeal Schönborn, de Viena d’Áustria, relata como lhe foi dada uma definição desse pecado das origens: “Um engenheiro (por sinal, um bom engenheiro) deu-me, uma vez, a definição mais bonita e simples de pecado original que em alguma vez ouvi.
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Pela sua experiência como técnico, ele sabe que, para poder trabalhar com as máquinas, precisa de um manual de instruções. “Se eu não seguir as instruções, não posso culpar o construtor da máquina se ela não funcionar”. O que este engenheiro quis dizer foi que o pecado original ou, mais precisamente, o pecado original dos nosso primeiros antepassados, foi a rejeição das instruções.
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Deus deu-nos uma natureza humana, nós somos seres criados e, na nossa natureza criada, Deus escreveu até certo ponto as instruções corretas de utilização daquilo que Ele nos deu. Se nós utilizarmos as instruções de forma errada, não podemos acusar Deus pelo mau funcionamento. O pecado original é a rejeição ao Criador. Querer ser como Deus, sem ser Deus, não querer receber de Deus, fazer tudo sozinho. “Vós sereis como deuses” (in Youcat/Crisma, pág. 27).
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Bento XVI, numa homilia em 8/12/2005, afirmava que todos trazemos dentro de nós próprios uma gota desse veneno a que chamamos pecado original. Explicava que o homem, seduzido pelas palavras da serpente, não confia em Deus, não quer receber d’Ele a existência e a plenitude da sua vida.
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Olha para Deus como um adversário que lhe restringe a liberdade, que não o deixa ser verdadeiramente humano, que precisa de o pôr de parte para ele próprio se fazer deus. Pactuar com o mal, usar um pouco de liberdade contra Deus é tido como um bem. Ao homem, o amor não lhe parece confiável, mas sim a ciência que lhe confere poder e com a qual pensa, com as próprias forças, vencer a morte e as trevas.
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Estes caminhos, porém, não são verdadeiros, precipitam a vida do homem no vazio e na morte, pois o mal envenena, não eleva, rebaixa e humilha, não enobrece, prejudica.
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No coração e na mente de cada pessoa há, de facto, uma lei, bem escrita e gravada, que devemos seguir em prol do nosso bom desempenho ao longo desta vida. É universal nos seus preceitos, a sua autoridade estende-se a todos, exprime a dignidade da pessoa, determina a base dos seus deveres e direitos fundamentais, dá-lhe um conhecimento inato de Deus e um conhecimento da lei moral, cuja plenitude e unidade se encontra em Cristo, que é, em pessoa, o caminho da perfeição e o fim da lei, porque só Ele ensina e confere a justiça de Deus (cf. CIgC1953).
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Fruto do amor, da sabedoria, da condescendência e da pedagogia paternal de Deus, Jesus, enviado pela Pai para nos salvar, indica-nos o caminho a seguir e os perigos a evitar, dando-nos a sua graça e fazendo-se companheiro de viagem. Por isso, ninguém poderá dizer: “Não é justa a maneira do Senhor agir!” Pelo contrário: a nossa maneira de agir é que não é justa” (Ez 33, 17).
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A iniciativa “24 Horas para o Senhor”, é mais um momento de graça para recordar e aprofundar as instruções que, gratuita e amorosamente, sempre nos foram oferecidas… plenamente, na Cruz!.
Por Antonino Dias, Bispo de Portalegre-Castelo Branco,
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