O que dizer de um “acordo” de concertação entre as IPSS e o Governo para 2023 quando em finais de Julho não se vislumbra a anuências das partes? O acordo que deveria ter sido assinado em 2022, arrasta-se penosamente com o envio por parte do executivo de um primeiro texto carregadamente ideológico num panegírico à acção do poder apenas em Junho passado!
Isto acontece com um governo de maioria absoluta, de natureza socialista: como entender então as dificuldades actuais, em definir um documento que respeite as mútuas relações entre IPSS e Governo?
Não se tratando de nada inédito, existindo até um longo histórico de acordos de cooperação com governos diversos do bloco central, como entender que em finais de julho o acordo se preveja difícil e provavelmente impossível?
As duas leituras da realpolitik
Em plena discussão do “Estado da Nação” hoje na Assembleia da República temos acesso à discussão política pura, na narrativa partidária. E sondagens circunstanciais apontam para uma crescente preocupação dos eleitores para a sua situação económica – individual e familiar – que consideram degradada ao ponto de considerarem que se vive uma situação semelhante à vivida no país por ocasião da intervenção da Troika no governo de Passos Coelho.
Ao mesmo tempo, o Governo puxa do Excel das contas públicas, aponta para o “excedente” das mesmas – o que será um excedente de um país com uma dívida superior ao que produz? – num “optimismo militante” que apenas conforta quem governa e por isso garante as mordomias do regime aos seus apaniguados.
Ora nas negociações entre as IPSS e o Governo sente-se este ambiente: por um lado as instituições testemunham a degradação económica, financeira e social dos portugueses e das suas famílias; por outro, dão mostras da sua própria degradação financeira em consequência da situação das famílias; e, por isso, esperam do Governo uma posição consequente e proporcional ao problema.
Para enfrentar esta questão, as IPSS – isto é, a CNIS , a União das Misericórdias e a União das Mutualidades – entendem que a parceria com o Estado se deve traduzir na assumpção por parte deste da responsabilidade de 50% dos custos de funcionamento das instituições.
Trata-se de um princípio de actuação que equilibraria a relação entre particulares e quem governa, deixando às instituições a exploração dos caminhos económicos a percorrer no sentido de garantir a sua sustentabilidade financeira a garantir junto das comunidade que servem.
Esta reivindicação é também oportuna por uma razão política que a prática social de muitos municípios tem vindo a desenvolver com a criação de IPSS “de laboratório eleitoral”, de efeito imediato e financiamento derivado mas proveniente dos cofres públicos mesmo que transmutados por circuitos que eles conhecem e nós também!.
Ora estas IPSS – que por razão de conveniência vamos tratar por IPARAMUNICIPAIS – aparecem como cogumelos nos gabinetes autárquicos, e imediatamente após o acto de criação recebem a herança (monárquica num república…) de serem integradas como “gestoras” de investimentos submetidos ao PRR … nas candidaturas municipais.
Independentemente da análise dos benefícios eleitorais imediatos em cada município (onde isso acontece) verifica-se que estas IPARAMUNICIPAIS nascem com um património atribuído à nascença – coisa nunca vista no universo das IPSS que para a sua constituição e funcionamento tiveram de angariar nas comunidades todos os esforços necessários para a sua constituição e funcionamento!
Ora como se percebe, para estas IPARAMUNICIPAIS as negociações entre IPSS e o actual Governo é coisa secundária senão mesmo desnecessária dado que contam exactamente com a beneplácita interpretação do partido que suporta o poder e parece tudo garantir desde que seja para inaugurar “novas realidades” sociais, nem que para isso seja necessário criar situações de absolta injustiça com IPSS históricas nas comunidades e que surpreendentemente se vêem em situação de concorrência desleal, por iniciativa do Estado!
O optimismo do Governo
Como se verifica actualmente o “optimismo militante” do Governo apenas conforta quem governa e por isso garante as mordomias do regime aos seus apaniguados. E por isso este “diálogo de surdos” acontece ao contrário das expectativa lançada pelo Primeiro-Ministro no Congresso da CNIS em Viseu:
Dado isto, o testemunho do Governo no “diálogo social”, como entender que em finais de Julho o acordo para 2023 ainda não tenha sido atingido? Para nós a dificuldade está aqui: a realidade social das IPSS e a capacidade do Governo em acompanhar as suas reivindicações entrou no impasse desenhado pela necessidade explícita das instituições e a falta de interesse político em aprofundar este modelo de cooperação.
Ao atrasar o processo e por isso ao investir na ruptura, pretende o Governo e o partido que o suporta implementar no país uma novo modelo – parapúblico de natureza municipal – dificultando a vida institucional de milhares de IPSS que tendo resistido contra tudo precisam de treinar a resistência contra este desinteresse do poder pela sua realidade.
Seja como for, o acordo será assinado nem que seja por efeitos de namoro prolongado deixando de fora quem realmente interessa. Mas a foto da assinatura está garantida.
Em narrativa político-partidária chama-se a este tipo de ilusionismo, a mexicanização do regime. Vão por mim, não digam depois que não avisei!
Por Arnaldo Meireles
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