A fezada da senhora Ministra – Ana Mendes Godinho – segundo a Agência Lusa – manifestou a sua confiança num “novo estado social, mais abrangente no seu investimento e na sua forma de intervenção”. Isto, ao mesmo tempo que anunciava ter “a economia social ultrapassado os 300 mil trabalhadores” sublinhando a “resiliência e inclusão desta área”.
Baseia-se, a ministra, nos dados administrativos da Segurança Social e que lhe permitem afirmar que o sector é “um enorme empregador em Portugal”.
“A economia social é resiliente. Em períodos críticos, a economia social consegue ter comportamentos completamente diferentes da economia global, como na pandemia foi capaz de manter e até criar emprego, num contexto em que estava a diminuir”, referiu, acrescentando: “Está a fixar pessoas, a dar respostas e a desenvolver novas atividades, sendo determinante com o seu papel resiliente e de grande dinamizador dos territórios”.
Além da resiliência e da capacidade para se ajustar às necessidades da sociedade, Ana Mendes Godinho chamou a atenção para o poder de inclusão de pessoas com alguma incapacidade para o trabalho e de promoção da igualdade de género, enquanto “exemplo de integração e participação ativa das mulheres no mercado de trabalho” em Portugal, mas apelando a ir mais longe em termos salariais e de cargos dirigentes.
A situação económico-financeiras das IPSS
Dada a generosidade da senhora ministra em “termos salariais” – expressão que os dirigentes sociais devem guardar com carinho, para momento oportuno – permitimo-nos recordar aqui as declarações do presidente da CNIS na apresentação do estudo sobre as Instituições Particulares de Solidariedade Social e onde se apresenta o quadro completo e actualizado da realidade da economia social e solidária:
Na mesma ocasião, o presidente da União das Misericórdias também apresentou a sua leitura da economia de “manta curta”:
A fezada da senhora ministra
Ler as declarações da senhora ministra à Lusa, sem ter em conta a história e a realidade da economia social e solidária no nosso país, pode levar o leitor a considerar que estamos no domínio de “novas realidades” acontecidas sob a manifestação do sol socialista que desde 2015 nos ilumina. E alma bondosa até pode concluir que os 300 mil trabalhadores são fruto da forte capacidade do PS em lutar contra o desemprego.
Mas quem por aqui anda, há bastantes anos “a virar frangos”, sabe que a realidade é pouco afoita a estas novidades anunciadas pois os dados referidos são o retrato social do país que é feito e realizado dia-a-dia pelas instituições, seus dirigentes e trabalhadores.
E tudo foi explicado em Coimbra por Lino Maia e Manuel Lemos (verificar vídeos acima editados). Mas então por que razão a senhora Ministra apresenta os dados como se fossem resultado do seu Governo?
Evidentemente porque exerce a função e tem a legitimidade para os apresentar, até porque são verdadeiros. No entanto, ficou por explicar – pelo menos a Agência Lusa não o escreveu – que a realidade da economia social e solidária tem mais de quinhentos anos em Portugal, se deve à dedicação de milhares de dirigentes e voluntários que ao longo de gerações garantem uma resposta social perante as necessidades sociais que em cada época a sociedade civil designa como prioritárias.
E também é evidente que esta realidade não foi criada por nenhum Governo, democrático ou não, sendo verdade que muita desta realidade foi edificada mesmo contra o governo do país e outras instâncias de poder de natureza local.
As novas realidades
A generosidade da senhora ministra levou-a a considerar na mesma ocasião ter chegado a hora de promover o “novo estado social, mais abrangente no seu investimento e na sua forma de intervenção”.
Os dirigentes sociais – aqueles que garantem com o seu aval pessoal os empréstimos das instituições – devem guardar esta frase na sua memória porque ela indica “os caminhos ainda não andados” pelo Governo nesta área e que estão a ser desenhados.
Para já apenas sublinhamos a convicção do Poder em criar o “novo estado social”, perguntando nós se o actual – nas palavras da ministra “resiliente” e garante de “inclusão” – precisa de ser refundado! para que se trabalhe no novo!?
Não é a primeira vez que na narrativa política, nos últimos quarenta anos, PS e PSD, nos brindam com o horizante de “novas políticas sociais”, sabendo nós que sempre fica tudo na mesma ou mais ou menos na mesma. E também dá para perceber que quando o poder nos vem falar de “novas …” qualquer coisa, é porque estão seguir a “velha estratégia” de usar a oportunidade de estarem no poder para fazer vingar – enquanto lá estão – as suas opções ideológicas, para mais tarde dizer “fui eu que fiz”.
É certo que esta atitude é mais monárquica que republicana, mas é sobretudo infeliz por não ter em conta a realidade que nos enche os olhos: as mudanças necessárias na economia social e solidária no nosso país terão de vir da obrigação da sociedade civil (instituições e voluntários) e do poder em responder aos actuais e novos problemas que afectam as pessoas.
E terá de ser à volta dos problemas das pessoas que instituições e poder se devem entender na melhor maneira de trabalharem para uma sociedade mais justa e civilizada. Resolver os problemas, e não produzir etiquetas de natureza oficial para que se possa pintar na narrativa política um país que não existe.
As instituições, os seus dirigentes e os seus trabalhadores não precisam de um “novo estado social”, mas merecem das estruturas do sociedade civil e do Estado a presença – apenas a necessária – para acompanhar o trabalho que é feito em todo o país.
Quanto mais o Poder conhecer o trabalho que é feito em Portugal na área da economia social e solidária, menor será o apetite para nos venderem novas realidades que de facto não queremos, mesmo com desconto.
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A fezada da Senhora Ministra
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